Ficcionalizar

 Eu criei este blog para mim. Porque, inspirada pelos ensaios da Natalia Ginzburg, eu queria deixar textos de assuntos diversos para posteridade. Lembrar do que vivi. E, of course, my horse, isto inclui dores, traumas e demais tristezinhas. 

Mas eu não fiz isso. 

Aliás, até fiz um pouco. Mas, nos últimos tempos, escrevi apenas gérmens do que poderiam ser textos muito complexos, mas que eu não tinha energia e, vejam só, coragem de escrever. 

Porque eu não queria mais ser vulnerável aos meus raríssimos leitores secretos. 

Logo eu, parça do Kafka, que sempre apareci com a minha própria face nas festas dos mascarados, caí no papo de um monte de gente que, opinando sobre a minha vida, dizia ser mais sensato ficar calada. Por que me tornar vulnerável para pessoas que poderiam se aproveitar disso, me fazer doer mais?

Eles tinham certa razão. Porém, ficando calada, minhas dores permanecem aqui onde estão. E elas precisam sair, rapeize. Rezar adianta até certo ponto, mas a transmutação verdadeira só acontece pela escrita. Pelo menos para mim. 

Eu quero que o que me aflige saia pelos meus dedos nesse código alfabético, nesse idioma borogodudo e melódico, por essa necessidade de mastigar e mastigar e mastigar sentimentos, impressões e ideias até elas se tornarem palavras. E que essa verborragia que me coube encontre pessoas capazes de compreendê-la. Eu quero dar um sentido para tudo. Quero limpar minha casa. 

Sendo assim:

não quero mais ficar calada

Porém:

também não quero ter feridas expostas

Preciso ficcionalizar

É, galera... acredito que o excesso de autoficções no nosso tempo é um sintoma. Com tantos vencedores, precisamos nós, os sensíveis, ser o centro de alguma coisa. Precisamos que nossas dores sejam dignas de atenção. Ouvidas. Quem REALMENTE nos ouve? E só ouvir basta? Escrever é elaboração. É transmutação. E é delicioso! 

Com a escrita, podemos soltar um exposed cheio de finesse. Organizar mentalmente, com bossa e travessura, dores só dantes ouvidas por 200 reais a hora. E botar nosso vilão da vida real mortinho da silva num caixão cheio de laranjas podres. 

No fim, inda podemos dar uma de sonsos: é só literatura! 

E quem pode afirmar o contrário?

Comments

Popular Posts