vemos o mundo como somos
Tem aquela frase "não vemos as coisas como elas são: vemos as coisas como nós somos", que atribuem à Anaïs Nin. Então, entendo que sempre tive muita coisa bonita dentro de mim. Sempre vi as coisas como prenhes de possibilidade. Nunca achei que eu era menor do que ninguém, de modo que, por toda minha vida, ostentei um topete enorme, mesmo na lama. Um purgante, meu pai dizia. Arrogante, minha mãe dizia. Mas se não fosse, onde estaria eu agora? Sinceramente, não sei. Se eu tivesse acreditado no que as vozes ao meu redor diziam sobre mim, eu realmente não sei quem seria. Onde estaria. Nem sei se estaria viva, na verdade, e não digo isso para causar choque, realmente não sei. Por isso que tanto me identifico com a frase de Audrey Lorde: "Se eu não tivesse me definido para mim mesma, teria sido esmagada pelas fantasias que outras pessoas fazem de mim e teria sido comida viva.".
Sempre sonhei com dias melhores e busquei ver beleza nas coisas. Graças a Deus, tenho o espírito feitinho todo pra isso, nasci para os devaneios. Às vezes me esforçava, às vezes não. Nunca estive rodeada de coisas belíssimas, já que moro numa cidade bastante singela nesse aspecto e morei quase que minha vida toda em uma casa instável e triste, então tinha que improvisar no olhar e na perspectiva. Foi bom, no fim das contas. Acho que treinei bem meu olho e, o mais importante, linguajar, para que pudesse criar minhas coisas próprias coisas belas, com o simples e ostensivo material de que dispunha, entre coisas não tão belas assim.
No meu coração, na minha vida, sempre me orgulhei do fato de que, aconteça o que acontecer, posso não dormir pela minha insônia crônica, mas vou deitar a cabeça no travesseiro sabendo que nunca fui filha da puta com ninguém. Faço o bem por fazer e guardo para mim. Faço favores sem pedir nada em troca. Ofereço palavras ternas. Peço desculpas quando erro. Às vezes falo demais, admito. Sou meio brucutu. Mas injusta, não. Então é isso, vivo tranquila.
No entanto, fui tão maltratada ou fizeram tão pouco caso de mim tão gratuitamente nos últimos tempos. Convites negados. Favores negados. Respostas rudes. Ghostings. E, aqui em casa, ofensas de todos os tipos. Sei lá, eu estremeci. Confesso que estremeci. Este texto teria outro final se tivesse sido escrito antes de ontem. Mas hoje me sinto um pouco mais forte.
De qualquer forma, estou aprendendo, eu acho. Eu não gosto de nada cristalizado. Acho que a vida é plástica, como nosso cérebro. O mundo é um lugar difícil sim. Preciso concordar. Passei por tantas coisas nesses últimos tempos que preciso, DE FATO, concordar. E, na verdade, eu já sabia, pela minha história de vida, talvez precisasse só desse sacode mais uma vez, talvez seja um treino, não sei. É isso: o mundo é um lugar difícil. Só que nunca acreditei que a essência dele era cruel. Nunca. Antes de ontem, eu poderia dizer que sim. Antes de ontem eu tinha me resignado à sua crueldade. Hoje digo que não.
Porque assim como não acredito que a essência do mundo é ruim. Também tenho a minha, incorruptível. Eu tenho a estranha mania de ter fé na vida. Eu tenho. Realmente, assim como a poeira, eu me levanto. Dói demais. Está doendo demais. Tenho vivido coisas realmente muitos difíceis, processos que me ferem a alma, me fazem duvidar de mim a todo instante, mas não vou deixar de acreditar que, viver é perigoso, mas prenhe de possibilidades. Não vou deixar que palavras alheias definam o que só eu sou capaz de definir. Eu mesma. Sou forte, corajosa, boa e inteligente. Coisas boas me esperam. Eu sei.
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